Projeto residencial

 

Projeto residencialLourenço Gimenes e Clara Reynaldo subvertem noções tradicionais
Por Nicole Smisek*
Quando se fala em Jardim Europa, bairro nobre na zona oeste de São Paulo, logo se pensa em casas enormes, espaçosas e extremamente amplas, com lotes de vinte ou trinta metros de frente. Em meio a mansões e museus de arte, uma casa em ruínas, implantada em um lote com quatro metros de frente por trinta metros de fundo, chamou a atenção do arquiteto Lourenço Gimenes, sócio do escritório FGMF.
Ele e sua esposa, Clara Reynaldo – que também é arquiteta – compraram a casa e com ela um desafio: implantar em um lote atípico uma casa “esteticamente interessante”. Em relação ao aproveitamento do espaço disponível, da luz natural e da boa resolução dos programas, eles se inspiraram nas pequenas casas japonesas e holandesas. Frente a isto, encararam o desafio como uma oportunidade. Propuseram espaços integrados, limitando aos usos indispensáveis. “Não é um programa de casa pequeno-burguesa”, afirmou Gimenes. O conceito tradicional do programa residencial foi subvertido. Não era possível pensar em um projeto com cozinha, copa, sala de jantar, sala de estar e outros cômodos clássicos.
A fachada da casa (1) surpreende pela ausência de portão, ficando completamente aberta e exposta para o exterior, sem barreiras entre o ambiente público e privado. “Quisemos dar um pouco do nosso espaço para a cidade, como uma gentileza urbana”, explica o arquiteto.
Ao entrar na casa é possível perceber a fachada negra que caracteriza o acesso pelo térreo, um dos únicos elementos de cor escura da casa. No entanto, ao passar pela porta há um grande nível de claridade proporcionado pelo piso branco de resina que vai até as paredes, estendendo-se ao forro e aos móveis. Parece que houve certa obsessão pelo branco (2), porém o projeto desmente esta suposição. “Antes de tudo, a escolha pela predominância do branco foi uma estratégia para refletir a luz internamente, levando-as a todos os pontos da casa. Foi uma escolha mais que estilística, foi estratégica”, explica Gimenes.
Uma longa passarela (3) delimita a circulação horizontal. Os ladrilhos, do artista plástico Fabio Flaks, possuem desenhos iguais, mas com peças dispostas em diferentes sentidos, dando a impressão de amplitude aos ambientes.
Outra surpresa é um jardim (4) que já estava presente na casa original e foi preservado no projeto devido a questões de aprovação com a prefeitura e recuos estabelecidos. Então, para respeitar esta imposição, o casal tentou fazer com que a sala tivesse uma relação direta com esse jardim, transmitindo uma continuidade com painéis de vidro que se abrem por completo. “O jardim possibilitou a fluidez visual da casa, inclusive entre os andares, com seus três planos transparentes banhados pelo sol”.
Se a sala se abre para o jardim, a única opção para a área culinária (5) era deixá-la voltada para a fachada. Esta proposta arquitetônica foge do convencional, lançando mão de espaços integrados e eliminando outros considerados obrigatórios. A integração foi acentuada pelo rebaixamento do piso da cozinha, possibilitando entrar na casa por um ambiente que ganhou mais destaque. Ou seja, ao entrar na casa, a grande vedete é justamente a cozinha, que cria uma nova noção de espaços, com um exaustor descendo do forro e o piso da sala que se transforma na mesa. Assim a área acabou virando um ponto de curiosidade e deu mais graça para o projeto.
Seguindo uma linha conceitual, é possível identificar traços de inspiração minimalista no projeto. Apesar do projeto de arquitetura residencial seguir parâmetros típicos, não há uma disposição tradicional dos ambientes, mas sim a projeção de um espaço amplo que, devido à utilização de um sistema de fechamento com painéis deslizantes e removíveis entre o jardim e a sala, viabiliza diversas alternativas de layouts, possibilitando ao morador diferentes experiências em relação aos ambientes. (6)
Há alguns elementos da linguagem moderna da arquitetura que se mostram presentes no projeto, tais como a tendência à abstração, a ampla recorrência às formas geométricas puras, a assimetria, os planos e balanços, as relações de transparência entre espaço interno e externo e a estética apurada dos detalhes construtivos. Todos estes pontos são resultados de inspiração na produção arquitetônica pós-moderna de vertentes minimalistas desenvolvidas nos Estados Unidos ao longo da década de 1960.
Ao passar por mais um lance de escadas há uma pequena sala de TV que dá acesso para um deck-jardim (7), ou “ecotelhado”, batizado pelo próprio Lourenço. A combinação de deck com o ecotelhado é feita a partir de um sistema formado por módulos de material plástico reciclado, com plantas e uma mini horta. O deck sombreia as telhas metálicas na estrutura, contribuindo para o conforto térmico de toda a casa. Com esta concepção para a cobertura eles acabaram criando um espaço de lazer que complementa o jardim do térreo.
De modo geral, é possível afirmar que o projeto da Casa 4×30 venceu complicações das mais diversas ao conceber uma casa em um lote tão estreito. O resultado é um ambiente singular, funcional e esteticamente eficiente.
 
* Nicole Smisek é estudante de Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
02.08.2012

Gabriella Mondroni

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